domingo, 9 de janeiro de 2022

The Sea and Poison (Umi to Dokuyaku) - 1986

Sinopse: Japão, década de 1940. Um hospital civil referência em tratamentos pulmonares se prepara para realizar um experimento de vivissecção em prisioneiros americanos. Dois jovens residentes se dividem quanto a participar da monstruosidade. Baseado em fatos reais.
 
Direção: Kei Kumai

Elenco: Eiji Okuda    
Ken Watanabe    
Takahiro Tamura    
Kyôko Kishida    
Mikio Narita 








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Comentário: 

    A princípio é de se estranhar que o classudo "Sea and Poison" seja absolutamente desconhecido enquanto o ignóbil clássico das locadoras de bairro "Campo 731", e suas sequências ainda piores, tenham notoriedade quase mitológica. A comparação vem de ambos terem sido produzidos mais ou menos pela mesma época, baseados em atrocidades reais que os japoneses cometeram na Segunda Guerra Mundial e os dois se valem da violência gráfica chocante como recurso narrativo (a do presente filme mais bem feita e comedida, contudo). Porém, há um motivo para você não ter ouvido falar dele. Enquanto o "Campo" foi financiado pelo governo chinês e amplamente distribuído pelo mundo com função propagandista antinipônica (nesse caso justificável até se for parar para pensar), "Sea and Poison" foi feita de forma praticamente independente dentro de um Japão mal resolvido com a sua história, onde qualquer menção da participação do país no conflito era (e ainda é) um tabu inominável.
     
    Após seu lançamento e subsequente controversa, a distribuição foi soterrada pelo estúdio e a coisa morreu. Uma pena. Trata-se de uma pequena obra-prima atmosférica com direção - perdão pelo trocadilho - cirúrgica e belíssima fotografia em preto e branco. A apuração minuciosa dos detalhes - oriundas da vasta pesquisa realizada por Shûsaku Endô, autor do "Silêncio", para seu romance homônimo - é secundária à fábula moral no cerne do filme. Quando médicos respeitados decidem puxar o saco dos milicos oferecendo sua então imaculada instituição para servir de palco para uma atrocidade, o interesse de Kumai se volta para a perspectiva de dois jovens e idealistas residentes que são cooptados para serem cúmplices. Entre os dois, o profundo conflito entre o desejo de participar do "progresso" científico envolvido em vivissecar seres humanos e agradar seus mestres, do outro a obviedade monstruosa do ato. 

    É difícil para nosso cérebro mensurar e compreender a magnitude de hecatombes como o holocausto (a morte de muitos é uma tragédia, a de milhões uma estatística, já diria o camarada Stalin), por isso "Sea and Poison" se dedica a estudar em uma escala reduzida como pessoas normais podem tomar parte em crimes atrozes. Apesar da postura diametralmente oposta dos "inocentes" Toda e Suguro, ambos sucumbem ao mal diante do verniz institucional (o exército, o imperador, o hospital, os mais velhos e sábios) e também, finalmente, pela perversa lógica utilitarista liberal (já que esses prisioneiros americanos seriam condenados à morte por fuzilamento, por que não aproveitar?)

    "Sea" é uma preciosidade, construída com uma calma silenciosamente tensa à qual muitos de nossos leitores inteligentíssimos certamente acusarão de ser chata e blá blá blá, por isso jogo um ossinho para vocês: aqui temos algumas das cenas mais intensas, bizarramente realistas e doentias de cirurgias já realizadas.

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